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A história que nos contam

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África foi destruída, apagada, dizimada e silenciada desde a escravidão de seus povos. Porque um povo sem cultura é um povo sem identidade, portanto, não é um povo. Os escravos africanos foram tratados como animais. Os escravos africanos obedeciam aos seus senhores, pois assim funcionava o sistema de dominação.  Quando resolvem contar a nossa história ou fazer pesquisas sobre ela, normalmente sempre falham, e já é esperado essa falha. Não temos professores negros falando sobre a história da África nas escolas, para mostrar aos alunos que definitivamente a África não é restringida ao limite material e histórico de servidão e apagamento. É muito mais enfatizado sobre como a nossa história não existiu do que sobre como tiveram tantos ancestrais africanos que continuaram resistindo a escravidão de diversas formas, mesmo que fosse às escondidas dos senhores. A nossa história não foi somente baseada em servidão e apagamento porque temos como principal marco e símbolo a luta de resistência

O Patriarcado na Composição das Emoções

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Já foi trazido ao debate feminista sobre a construção social da mulher e sobre quais os problemas e dificuldades a qual nós enfrentamos, por sermos submetidas a constantes violências internas e externas que a nós são imbuídas. Em geral, eu sempre digo que o único sentido verdadeiramente radical da vida de uma mulher consciente é a ressignificação de toda a sua concepção acerca das coisas: porque absolutamente tudo ao nosso entorno diz respeito ao patriarcado. Até quando nos olhamos no espelho e logo pensamos (vai dizer?), "será que estou bonita assim?", "será que assim é mais aceitável ?". Vivemos rodeadas por homens falando sobre como historicamente a nossa existência nunca existiu e sobre como somos tão "sensíveis, afetuosas e reprodutoras", exatamente como uma máquina de uso coletivo (para o coletivo dos homens) e de uso reprodutivo e servil (para uso coletivo dos homens explorarem nossos corpos e a servidão enquanto estrutura para que eles seguissem o

Carta aberta ao relacionamento abusivo que ainda vivo #projetohisteria

Quando li a respeito do Projeto Histeria, ministrado pela Natacha Orestes e outras mulheres, senti um largo interesse dominar as minhas vontades. Quis imediatamente que meu blog também fizesse parte de uma plataforma colaborativa e social para ajudar sobreviventes de abuso sexual a serem virtualmente confortadas. Mais adiante penso em rebuscar melhor esse projeto a fim de também atuar em parceria com o #projetohisteria. Resolvi falar também, substituindo o nome por letras variadas.  Dentro de mim todos os nervos estão atacando um ao outro. Como se houvesse uma guerra. Um vazio tão grande coberto de soluço, medo e aflição. Eu não sei se amei Z. Porque dói e fazia doer velhas feridas abertas na minha infância. Eu busquei reconhecer em nosso namoro todas as tuas qualidades sobrepondo, assim, todos os teus erros acima e sob qualquer custo. Dói continuar um ciclo repetitivo onde nada evolui, e onde nada se transforma. Dói na mesma magnitude compreender que nem um homem será, um dia, c

A reconstituição da mãe e da filha

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Eu estava pensando na minha mãe. Hoje acordei pensando nela e muito provavelmente vou dormir pensando nela. À minha volta eu vejo muitas mulheres que sofrem nas relações com as suas filhas. É difícil esperar que a maternidade seja assertiva quando ela é imposta, quando ela é introjetada compulsivamente pela heterossexualidade e pelo homem. A maternidade, assim como o estupro, e decorrente do mesmo, é incisiva na estrutura social de dominância. É a arma secundária do patriarcado para manter as mulheres secularmente domesticadas por uma suposta preparação para tornar-se mãe. Ser mulher é tornar-se a mãe fantasiosa bíblica e sagrada: cuidar dos filhos, da casa, do marido, ocupar-se em ver novelas e telejornais, às vezes sair com as amigas para falar sobre coisas supérfluas, abdicar-se de suas necessidades para suprir a dos filhos e do marido, dedicar-se quase que cegamente à criação de outro ser e, quase sempre, buscar algum tipo de conforto e estabilidade emocional/econômica na vida de c

Quantas Julias Cabem Em Nós

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Por correr em sigilo de justiça, os nomes de todos os participantes deste caso foram omitidos. O primeiro indício foi agitação noturna. O sono agora era inquieto, com algumas frases soltas: “não… para… não quer”. Apenas o que o vocabulário de uma criança saberia pronunciar. Julia tinha dois anos e meio quando surgiram os primeiros sinais do abuso sexual. Hoje tem sete anos, e ainda permanece em situação de risco. Logo em seguida ao sono turbulento, desenvolveu pavor por qualquer figura masculina, salvo raras exceções. Pequenos movimentos a assustavam, mesmo que não direcionados a ela. Fechar a porta do quarto a aterrorizava. Paralelo ao medo surgiu um comportamento estranho: brincadeiras sexualizadas. Num dia, levantou a roupa da boneca, colocou-a no colo e proferiu uma frase que chocou a mãe e avó materna: “Não gosta, vovô … não gosta…” Todos os comportamentos apresentados por Julia, uma menina de Campo Grande, MS, são considerados comuns em crianças vítimas de violê

O estupro e a raiva

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Em desabafo escrevo para mim mesma e para aquelas que comigo se identificam e que com elas eu me identifico. Às vezes ser mulher negra não é nada fácil, e quase sempre nunca é. Mas de vez em quando, repentinamente, nos pega de surpresa um sentimento tão grande e imenso de vazio e cansaço que é difícil explicar. Estupros, incestos, violência doméstica, violência nos partos, abusos sexuais na infância, doenças decorrentes a maus tratos sexuais, todos estes são fatores que fazem com que a vida de muitas mulheres e meninas se tornem imparcial e uma só. Não importa em qual parte do mundo estejamos: estamos sofrendo, morrendo, tendo que conviver com as lembranças de um abuso sexual cometido por algum homem. É horrível. É absurdo ter que viver assim, doente, pensando nos espaços vagos que tantos traumas e exigências nos colocaram ao longo da vida. É, muitas vezes e na maioria delas, muito difícil ser mulher. E quando se é negra, bom, a dificuldade que já é insuportável consegue piorar.  Uma